Lara tinha 9 anos quando sentiu o pedaço de carne em sua boca pulsando e VIVO, ora, e sua garganta se fechou e não foi capaz de engolir. Correu para o banheiro e cuspiu na privada tudo que tinha na boca — a língua, quase —, também vomitou.
Quando explicava o porquê de seu vegetarianismo, caçoavam da história — “Quer dizer que você é das que cospem?”, “Você não gosta quando a coisa pulsa na sua boca?” — ou chamavam-na de alienada, pois faltavam razões políticas, enfim.
Uma vez, Lara disse:
— Foda-se.
***
LARA
Ah... Quando eu tinha uns nove anos, eu tava comendo um bife, acho, e aí eu comecei a... sei lá, eu tava mastigando e eu senti o negócio VIVO, sei lá, PULSANDO. Aí eu não aguentei e fui cuspir e vomitei tudo.
ALGUÉM
Na mesa?
LARA
Não, eu comecei a ficar enjoada e corri pro banheiro.
ALGUÉM
Então você é do tipo que cospe? Você não gosta quando pulsa na boca?
(ri sozinho)
Mas, sério; quer dizer que você não come carne só porque tem NOJO?
LARA
Você acha pouco?
Lara se ajeita na cadeira.
ALGUÉM
Não, é só que... e as implicações éticas? Esse papo de indústria da carne e tudo mais?
Lara puxa o copo com COCA-COLA, pega o canudinho e o coloca na boca, suga um pouco, olha para Alguém.
LARA
Foda-se isso tudo.
***
Viva, ela é pulsante
a carne eu cuspo, sim; sim
eu sou dessas, mesmo.