sábado, abril 30, 2011

Brincando de drama.

Rob entra em casa, vestindo sua roupa de trabalho. Encontra sua mulher, Clara, sentada numa poltrona ao lado de uma barraca montada na sala de estar. Ela segura um copo de conhaque em uma mão e parece dormitar.

ROB
Bebendo às quartas? Qual é a boa?

CLARA (coloca o copo no chão, levanta-se e vai animada até Rob, abraçando-o)
Você, de volta! Eu senti tanto a sua falta, sabe? Você está tão cheiroso...

Rob larga-se dela e senta-se na poltrona.

ROB
Que exagero! Fedido, você quer dizer. Se existe estar meio-morto, é assim que eu estou. (Olha para a barraca.) Seu dia parece ter sido divertido, no entanto.

CLARA (senta-se no colo dele)
Você não imagina como! Arrumava os armários quando achei nossa tendinha, lembra?

ROB
Sim, era bom, era muito bom. Eu vou tomar um banho, agora.

Clara inclina-se sobre ele e o beija na boca.

CLARA
Por que você não entra na nossa tendinha?


ROB
Ela está arejando, não está? Você sabe muito bem que tenho cá minhas alergias.


CLARA
Sim, com certeza, mas e eu? Eu montei a barraca mesmo assim, eu me sujei toda por você. Vê meus olhos vermelhos?


ROB
Sim, e a face inchada e essa boca quase explodindo. Se eu não conhecesse suas alergias, acharia que você passou a tarde inteira chorando. Mas hoje não é um bom dia para joguinhos em uma barraca.

Rob se levanta, forçando Clara a ficar de pé. Rob começa a ir em direção ao quarto.

CLARA
Não! Espere um pouco, temos visitas!


Rob vira-se para Clara.

ROB
Numa quarta-feira?


CLARA
Você sempre me disse que todo dia é dia quando nós o queremos bem. Hoje é um dia especial.

ROB
Sim, o dia em que se toma uísque, montam-se as barracas e chamam-se as visitas. Quem vem pra cá?


CLARA
Eu estava me sentindo muito sozinha à tarde, sabe? Você não estava aqui...

ROB
Costuma acontecer quando eu trabalho, como nas quartas-feiras...


CLARA
Mas você voltou pra mim, não é? Para nossa tendinha. Chegou tarde...

ROB
Estou enfiado até a cabeça nas reuniões com os chineses, não me encha por causa disso!

CLARA
Afunda-se até a cabeça...

ROB
Só quero um banho, conversamos depois, na cama, quentinhos e tudo mais.

Clara aperta seu corpo contra o de Rob, intensamente.

CLARA
Agora, na barraca.

ROB
E a visita? Ela não vem?


CLARA
Já veio. Ajudou-me com a barraca, sujou-se comigo, também.

ROB
Ela a ajudou.

CLARA
Como ela sempre lhe ajuda.


Rob larga suas coisas no chão e se senta novamente na poltrona, derrubando acidentalmente o copo com conhaque no chão. Ele apoia a cabeça entre as mãos.

ROB (
irritado)
Quem, Clara?


CLARA
Entre e veja! Você sabe, você é bom de entender as coisas, sempre percebe tudo bem antes de mim... Vai, entre!


ROB
Você não devia beber às quartas-feiras.


CLARA
Você nunca volta para casa às quartas. O que você faz às quartas?


ROB
Os chineses, Clara, eu já lhe disse! Os malditos chineses me tomam todas as noites.

CLARA
Você chegou cedo, onde estão os chineses? Talvez seus chineses estejam aqui, não é, na nossa tendinha?


ROB
Você delira, arre! Você mesma disse que  eu cheguei tarde! Arre, Clara, arre, deixe de maluquice e de conhaque, você parece um...

Clara pula novamente em seu colo, beijando seu pescoço.

CLARA
Você não está cheirando a reunião com os chineses! A reunião foi cancelada, não foi? Ela não respondeu suas mensagens e você veio direto para casa, pra mim, para a substituta. Mas eles também vieram pra cá, pra nossa reunião! Vamos, entre!

ROB
Entro, porque não há chinês algum, tudo bem, joguemos o seu jogo infantil!

Rob se levanta, retirando Clara rudemente de seu colo. Vai em direção à barraca.


CLARA
Se você entrar nessa barraca, é nosso fim.


Rob entra na barraca.

segunda-feira, abril 25, 2011

prova de xilo: lara ao parapeito.

retratos

em suas mais variadas formas
em suas mais variadas
em suas

terça-feira, abril 19, 2011

COVEIROS.

PERSONAGENS

PRIMEIRO PROFESSOR, chefe da área de português da escola.
SEGUNDO PROFESSOR, recém-contratado da área de português.
GUSTAVO, 14 anos, aluno exemplar, filho de deputado.
HENRIQUE, 13 anos, aluno e braço direito de Gustavo.


CENA

Sala dos professores, grande montanha de papéis sobre as mesas.

Dois professores entram com mais papéis nas mãos e se jogam sobre as cadeiras, com canetões vermelhos nas mãos, rabiscando com ênfase os papéis.

PRIMEIRO PROFESSOR
Acha justo que um aluno seja reprovado por copiar as respostas de outro?

SEGUNDO PROFESSOR
Creio que sim, está no regulamento, não está? Se os diretores decidiram assim, a questão não está mais em nossas mãos.

PRIMEIRO PROFESSOR
Não devia ser o outro, o que deu as respostas, também punido?

SEGUNDO PROFESSOR
Não se ele o houver feito por compaixão? Se o coração está leve...

PRIMEIRO PROFESSOR
Mas está aí, justamente, o problema! Como alguém pode fazê-lo de mente limpa? Ajudar um crime, torná-lo possível, é pior do que cometê-lo de fato. Se alguém dá a faca e o queijo para outra pessoa, é certo que esta outra cortará, com a faca, o queijo.

SEGUNDO PROFESSOR
Não podemos punir nosso melhor aluno, está na ata da reunião de ontem. A culpa é do burro que aceitou a cola.

PRIMEIRO PROFESSOR
Que parvice!

SEGUNDO PROFESSOR
Na verdade, se quer saber... Se ele não fosse filho de político, levava uma boa reprovação na testa.

PRIMEIRO PROFESSOR
Arre, mas esse é o absurdo! Um professor… O importante são as notas, o importante é a conduta! Não há nada menos importante para um professor do que o pai de um aluno. Veja esse monte de lixo, essas respostas incoerentes… Temos que poder corrigi-las, riscá-las, puni-las!

SEGUNDO PROFESSOR
Certo, certo, muito certo.

PRIMEIRO PROFESSOR
Pois, como é que se deve punir bem um aluno?

SEGUNDO PROFESSOR
Reprovando-o?

PRIMEIRO PROFESSOR
Sim, parvo, mas não só isso! Saiu-se com a resposta mais simplória que pensou, isso vale no máximo um meio certo.

SEGUNDO PROFESSOR
'Como é que se deve punir bem um aluno'?

PRIMEIRO PROFESSOR
Foi o que lhe perguntei.

SEGUNDO PROFESSOR
Não sei, peço água.

PRIMEIRO PROFESSOR
Ah, água? É mesmo um imbecil. Mas não pense demais no assunto para não fritar essa cabeça enorme! A boa punição é social, parte por todas as camadas da vida do cabritinho, faz com que ele se arrependa de sua preguiça, burrice – o que quer que seja – com cada pelinho de seu corpo. Como fazer isso? Vai, busca um café para mim e sua tal água, e pense bem no assunto! (Sai o segundo professor.)

Vêem-se Gustavo e Henrique aproximando-se à porta da sala

PRIMEIRO PROFESSOR (Corrige as provas ferozmente e cantarola.)

Tu és tolo, tu és tolo como porta.
Se eu te digo: tu saíste a teu pai
Ah, não creias que isto é um elogio:
Tu saíste mesmo, mesmo a teu pai

GUSTAVO
Como ele canta assim, corrigindo provas como se lavasse o chão?

HENRIQUE
Talvez lavar o chão e corrigir nossa concordância seja a mesma coisa pra alguém que passa os dias fazendo isso.

GUSTAVO
A repetição só esvazia, a repetição só esvazia.


PRIMEIRO PROFESSOR (Cantarola.)

Não te escondas, não te escondas de teus erros.
Se eu te digo que errar é coisa humana,
Ah, não creias que isto é um elogio:
Tu és humano, mesmo, mesmo, por inteiro

(Amassa uma prova e joga em direção à porta.)

GUSTAVO
Essa prova jogada ao chão foi de um aluno que colocou todas as suas forças, estudou três semanas, negou todos os compromissos, perdeu um pouco de sua própria vida! Foi assim, não foi?

HENRIQUE
Acho que sim, cara.

GUSTAVO
Ou então, de um que nunca tivera problemas antes, que se sentou para a prova-final insuspeito, e agora... Agora sua prova está no chão, agora deve passar mais um ano chafurdando na bosta!

HENRIQUE
Bem provável.

GUSTAVO
É isso, então é isso mesmo, e agora é lixo!

PRIMEIRO PROFESSOR (Cantarola.)
Errado, errado e errado.
Errado, errado, errado, errado!
Tudo que tu tens feito
é errar ao quadrado!
(Arremessa outra prova)

GUSTAVO
Eis outra. Poderia ser de qualquer um de nós. (
Pega a prova amassada.) Como brincam com nossa juventude, marcam com machados nossa vida, esquecem que já somos pessoas! Este papel amassado significa nosso fracasso social, não?

HENRIQUE
É.

GUSTAVO
Não tem medo de ser essa prova tua caveira?

HENRIQUE
Já sabia que não me daria bem, cara.

GUSTAVO
É esse tipo de atitude que permite que nos esmaguem. Vou lá ter com ele. (
Adianta-se.) De quem são essas provas?

PRIMEIRO PROFESSOR (sem tirar os olhos das provas)
Minhas, ora.
Não, não, não,
parece que fizeste um errão!

GUSTAVO
Não são suas, ainda que as trate como tal.

PRIMEIRO PROFESSOR
Espero que não sejam suas, então, pois que a coisa aqui é podre.

GUSTAVO
Percebo bem a podridão. Muitos reprovados?

PRIMEIRO PROFESSOR
Poucos, infelizmente. Muitos me escapam pelas frestas dos dedos.

GUSTAVO
Escapam como?

PRIMEIRO PROFESSOR
De toda forma, por sorte, por cola, mas alguns, mesmo, apenas porque têm pais que os protegem.

GUSTAVO
Como pode um pai proteger o filho da reprovação?

PRIMEIRO PROFESSOR
É justamente o que eu pergunto. A sombra de um pai poderoso assusta o povo lá de cima, como se a má índole de uma criança pudesse ser justificada pelo emprego do pai.

GUSTAVO
Deixá-lo-ão impune, portanto?

PRIMEIRO PROFESSOR
Sim, às custas do pobre asno que aceitou sua ajuda. Mas todos terão sua vez, minha caneta é justa. (
Amassa uma prova e joga em direção a Gustavo.) Veja se isso é possível!

GUSTAVO
Deixe-me ver (
pega a prova). “Casmurro traiu sim a Capitolina dá pra ver logo no começo da história porque ele é sério e isso significa culpa”. De quem é essa afronta?

PRIMEIRO PROFESSOR
De um imbecil, o que acha?

GUSTAVO
Não adianta perguntar, eu não sei.

PRIMEIRO PROFESSOR
Este enorme imbecil, esta anta completa, se não a reconhece, é um tal de João não sei das quantas, garoto-problema, repetente, uma vergonha.


GUSTAVO
Ora, como ele pode falar assim? Estamos todos sujeitos ao erro, mesmo João, taciturno, com as mãos metidas nos bolsos do moletom… Somos gente! Se na grafia identifica a ignorância, devia corrigi-la, e não puni-la! Oh, João, pobre tolo, pobre tolo. Diga-me, Henrique…

HENRIQUE
Digo. O quê?

GUSTAVO
Estamos sozinhos com nossos erros, todos?

HENRIQUE
Sim, parece que sim.

GUSTAVO
E seremos punidos assim?

HENRIQUE
Uns mais, outros menos.

GUSTAVO
Como somos fracos, Henrique! Se estamos sujeitos à queda, se mesmo Napoleão caiu de seu cavalo, como podemos continuar? As provas estão por toda parte, os juízes estão sempre prestes a entrar em cena e nos esmagar. A partida é perdida, sempre. Mas quieto, quieto – lá vem os diretores com o pobre asno que mandei à forca. Escondemo-nos!

(Saem.)

sábado, abril 16, 2011

conto de celular (:

Surpreendo um gnomo me espiando enquanto me dispo. Sorrio e pergunto se ele quer massagear as minhas costas. Excitadíssimo, ele goza no chão instantaneamente e explode numa fumaça roxa.

segunda-feira, abril 11, 2011

sábado, abril 09, 2011

1, 2, 3, 4

dansa dansa dansa
corpo corpo corpo
chão chão chão

dansa corpo chão
no chão
o corpo
dansa

quarta-feira, abril 06, 2011

João Paulo Segundo.

P. Ah, escrever, escrever é viver, viver é escrever! Onde deito minha pena, os deleites deleitam e amamentam um mundo outro de posturas e possibilidades! Ah, mas quem vem aí?
J. Olá? Quem está à luz de velas?
P. (curvando-se sobre os papéis) Oh, parece-me que... João! Bom lhe ver aqui, amigo meu!
J. Ah, Paulo, que agradável surpresa. Que faz?
P. Não lhe interessa de verdade, coisas de um mundo outro.
J. É mesmo? Pois acabo de retornar de uma corrida no parque e mal sabe o que me aconteceu.
P. Não o sei, mesmo...
J. Pois...
P. Pois?
J. Pois que enquanto eu corria... Ora, conto-lhe, ainda que seu orgulho me esconda tudo! Estava eu correndo quando vi uma moça, veja bem, uma moça com as pernas de fora...
P. Fato bastante incomum nesses dias ensolarados.
J. Caída no chão, veja bem, as pernas descobertas pelo short e uma poça de sangue a seu lado!
P. E por quê?
J. Ora, me diga você! Por quê?
P. (desinclina-se de sobre os papéis, pondera com a caneta na mão) Oh, mundo, mundo, cruel mundo! Foi ela engolida por um automóvel?
J. Nada, nada!
P. Pois então que foi alvejada pela faca de um assaltante, ou, numa crise convulsa, caiu-se no chão, afetada pelos humores e amores de nosso tempo... Uma Werther de sua própria consciência, vertendo-lhe a alma o acesso nervoso súbito.
J. Lindo, lindo, porém falso, oh, muito falso!
P. Então o quê? Atiraram-lhe uma pedra, Madalena moderna sem Cristo a defendê-la?
J. Jesus que me livre, também não o foi.
P. Então o quê?
J. Que faz aí?
P. Eu?
J. Sim, você, ora, é claro!
P. Confabulo sobre a causa da queda da moça de shorts curtos, você bem o sabe.
J. E debaixo de seu braço, escondido o papel?... Escreve?
P. Ora, de que importa!
J. Tenho quase certeza que o ouvi louvando qualquer coisa. Passou a acreditar em Deus?
P. Sim, sempre acreditei com toda a força de meus cabelos.
J. Não use sua calvície como rota de fuga irônica! Escreve ou não escreve?
P. Escrevo.
J. Então bote aí, Paulo de Medeia, firule bem sua caligrafia: a moça dos shorts curtos não existe e você é um tolo.
P. (levanta-se, apontando a caneta ameaçadoramente para João) Quem, eu ou você?
J. Arre, reage rápido e infantil. Vá a merda, que vou ao mercado comprar queijo.
P. Passe bem, sofista!
J. Passe à merda, passe à merda!

terça-feira, abril 05, 2011

João Paulo.

J. O que é que você está fazendo aí?
P. Oh! Se eu lhe dissesse, se eu lhe dissesse...
J. O quê, mas o quê? O que esconde aí, debaixo dos braços, olhos desconfiados?
P. Meu amigo, meu companheiro, não posso lho dizer! Se o fizesse...
J. O que é, diga, diga!
P. Você já o pressente.
J. Não, o quê?
P. Se eu lhe dissesse...
J. Chega de se repetir, pelo amor de Deus.
P. Sim, concordo; por que quer saber?
J. Porque você esconde.
P. Por que eu escondo?
J. Como eu vou saber?
P. Vai saber.
J. Vou?
P. Vai, oh, claro que vai!
J. Então o quê? O que você está fazendo aí?
P. Por Deus, chega de se repetir!
J. Está vendo? É você! Você, que não quer me dar nada, só costura com as palavras.
P. Não costuro nada, como é cego.
J. Então...
P. Então?
J. Passar bem.
P. Passemos. Adeus!

segunda-feira, abril 04, 2011

sem título, abril de 2011.

níveis de realidade
corpo no caminho
abraços inevitáveis