[você já sabe, vi seu nome e quis escrever e por enquanto é só seu, mas por enquanto]
não existe mais isso de oi e tchau, porque o cumprimentar não cumpre comprimentos, não aproxima nem distancia, isto é, é só uma régua. não me aponte o dedo nem diga que você já sabe como isso termina, que já conhece meu jeito de argumentar, meu gosto pelos gostos caros, sim, você está certa, mas isso não me torna de todo previsível, legível, superficial -- nos bons e maus sentidos. sim, sei muito bem que a originalidade não é meu forte, que vivo de repetição, que meu vocabulário e minha retórica são fracos, fraquinhos, e que você só deixa eu segurar sua mão porque sabe que é melhor balançar a cabeça do que não balançá-la. a pena é minha, e não sua, e você não deve tê-la de mim, nunca, ou então será ainda pior, mais postiço, unhas e dedos que se perderão numa infinidade de lugares comuns como seu braço e logo tudo que podemos imaginar, mas não é assim, não, a linha do raciocínio, você já sabe que não chegarei lá e que só falo isso porque estou bêbado de sono, de imenso de gordo, sujo, insossial. de fato, já vejo sua impaciência, sempre, seus olhos vibrando de terror de ficar aqui me ouvindo, mas só assim eu me acalmo e te deixo em paz, isto é, sim, sinto muita falta, sei que você dirá que já passou e que não sente nada e que provavelmente nunca sentiu nada, mas é mentira, eu sei muito bem que eu sabia como fazer gozar, como ter um orgasmo ridiculamente grande, do tamanho do mundo, do tamanho do tempo que ainda temos juntos, mas isso de oi e tchau não existe e eu já te disse muito mais vezes do que você imagina. se é assim, se você acha que é só encarar a folhinha de papel ou o vidro entre nós, fingir que não escuta ou, pior, fingir que escuta enquanto eu falo e falo e talvez logo eu chore, não, não é assim que você deve fazer, você transparece sua fraqueza, é óbvio demais que você sofre comigo e com o que eu digo, que isso não é brincadeira não, sinto muito, então sigamos em frente, você pode olhar para seus cadarços ou não olhar para nada e eu sei muito bem que não existe vidro entre nós e que não existe um telefone e que nos falamos frente a frente, que não existe nada entre nós a não ser a prisão, e, pra ser sincero, não sei nem mais se a prisão existe, se não inventei entre eu e você isso, se os filmes não me enganaram, não me fizeram acreditar em nada que não a verdade, porque quando vejo você e penso que poderia muito bem tocá-la e que mesmo na prisão isso é permitido, talvez principalmente na prisão, não sei, alguma coisa faz dor no estômago e minha cabeça roda, roda, roda e eu posso muito bem vomitar, mas não na sua frente, não agora, na hora do sol, do banho, do descanso, da visita, não. porque ficar preso a uma ideia é muito pior do que ficar preso pelos homens e, pra ser sincero, eu me sinto preso pelas ideias e não pelos homens e são só as ideias que me impedem de correr pelos campos e ser infeliz, digo, feliz, desse jeito burro, descompromissado, verdadeiro, isto é, enfim um homem do campo e não um homem da cidade. mas o mais importante é você, que está aqui e me encara e parece engolir suas unhas, se bem que não rói unhas, nunca roeu, enfim, mas sua mão na minha, mas isso não é cumplicidade, isso não pode ser pena, que é minha, não tenha pena de mim, nem piedade: confesso que fiz tudo que fiz e que estou disposto a provar que sou culpado até a minha morte.
é difícil ser um artista contemporâneo, com tamanho volume de referência que temos pra acompanhar diariamente...
ResponderExcluiré seu esse texto, claramente.
ResponderExcluirDe todas as coisas a se falar, escolho dizer que "insossial" foi muito bem cunhado.
ResponderExcluirFazia anos que eu não entrava aqui...
ResponderExcluirMe deu saudades. Um bocado.
V.