domingo, junho 24, 2007

O amor.

"Você me deixa usar seu corpo? Eu preciso de todo você, cada ossinho, cada juntinha, cada milímetro cúbico... Oh!, sem seu busto, seus braços, cada uma de suas partes, não posso ser nada, não posso fazer nada, nunca sairei do ponto maldito em que me encontro! Deixe-me apalpá-lo, senti-lo, observá-lo, vedá-lo... Entregue-se de uma vez para mim, liberte-se disso tudo e apenas permita-me que..."

Cansado daquela bobagem sem sentido – além de repetitiva ao extremo –, amassei o bilhete que me esperara dentro de meu pequenito armário escolar e me livrei de uma vez daquele lixo.

Entretanto, enquanto finjo assistir às minhas aulas de sempre, posso rever o reverberar daquelas palavras assustadoras, mas, pensando bem, dulcíssimas.

Sim... Deliciosas! Quais seriam as últimas palavras do pedaço de papel que eu, tão insensível, joguei fora agora mesmo? Corro, às gotas, direto para o lixo, enfio desesperadamente todo o braço e agito-o em busca d'algo. O plástico negro é também escuro ao toque, já que nada revela a meus dedos fervorosos, por mais insistentes que sejam... Enfio o rosto, enfim, naquela espécie de túnel extra-dimensional que nos livra do que não queremos mais, e nada novamente.

Como última tentativa, coloco meus dois braços naquele enorme vaso plástico, então a cabeça, o tronco, as pernas, tudo que pôde caber naquele espaço limitadamente ilimitado. Acho que sempre há espaço para mais lixo...

Maravilha! Acho finalmente um pedaço de papel amassado!

"... Entregue-se de uma vez para mim, liberte-se disso tudo e apenas me permita que eu o engula inteiro e nunca mais... Nunca mais nos separaremos!


Obrigado pela compreensão."

4 comentários:

  1. E o lixo comeu.
    Comer é amar.
    E amar é comer.
    E o lixo come você.
    E você come o lixo.

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  2. Na União Soviética, o lixo joga VOCÊ!!!

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  3. cara, esse foi inspirado

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  4. Eu fiquei deprê porque eu adorei este post e ninguém comentou e as pessoas comentam meus lixos dadaístas e yeah.

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